Terra-rara
Nota: Para outros significados de a teoria astronómica, veja Hipótese da Terra rara.
As terras raras ou metais de terras raras são, de acordo com a classificação da IUPAC, um grupo relativamente abundante de 17 elementos químicos, dos quais 15 pertencem na tabela periódica dos elementos ao grupo dos lantanídeos (elementos com número atómico entre Z=57 e Z=71, isto é do lantânio ao lutécio), aos quais se juntam o escândio (Z=21) e o ítrio (Z=39), elementos que ocorrem nos mesmos minérios e apresentam propriedade físico-químicas semelhantes.[1] As principais fontes económicas de terras raras são os minerais monazite, bastnasite, xenótimo e loparite e as argilas lateríticas que absorvem iões.
Índice
1 Origem da designação e história
1.1 Etimologia dos elementos
1.2 História
2 Características e usos
3 Localização geográfica e comercialização
4 Grupo das terras raras
5 Notas
Origem da designação e história |
Os elementos que constituem o grupo das terras raras foram inicialmente isolados sob a forma de óxidos, recebendo então a designação de "terras", à época a denominação genérica dada aos óxidos da maioria dos elementos metálicos. Por apresentarem propriedades muito similares, serem apenas conhecidos em minerais oriundos da Escandinávia e por serem de difícil separação, foram considerados "raros", daí resultando a denominação "terras raras", ainda hoje utilizada, apesar de alguns deles serem comparativamente abundantes na composição crostal da Terra.
Com exceção do lantânio, que por ser instável é muito raro, a abundância crustal dos elementos incluídos no grupo das terras raras varia entre as 68 partes por milhão para o cério, o 25.º elemento mais abundante dos 78 elementos mais comuns na crusta da Terra, e apenas 0,5 partes por milhão para o túlio e o lutécio, as terras raras menos abundantes. Ainda assim, o elemento mais raro da série, o túlio, é mais abundante que metais como a prata e o mercúrio. Portanto, os referidos elementos não são "terras" e não são "raros".
As terras raras foram pela primeira vez assinaladas aquando da descrição do mineral negro ytterbite (também conhecido como gadolinite a partir de 1800), feita pelo militar e mineralogista Carl Axel Arrhenius no ano de 1787, a partir de uma amostra recolhida numa pedreira das proximidades da localidade de Ytterby, na Suécia.[2]
Etimologia dos elementos |
Muitos dos elementos incluídos nas terras raras foram denominados em honra dos cientistas que os isolaram pela primeira vez ou que descreveram as suas propriedades físico-químicas elementares, pela sua origem geográfica, por referência à mitologia clássica greco-latina ou por neologismos latinizados ou helenizados.
Os elementos incluídos na categoria, e a respectiva etimologia, são os seguintes:
Nome | Etimologia |
---|---|
Lantânio | do grego "lanthanon", escondido. |
Cério | da deusa romana da fertilidade Ceres. |
Praseodímio | do grego "praso", verde, e "didymos", gémeo. |
Neodímio | do grego "neo", novo, e "didymos", gémeo. |
Promécio | do titã Prometheus, que deu o fogo aos mortais. |
Samário | em honra de Vasili Samarsky-Bykhovets, descobridor do mineral samarskite. |
Európio | de Europa, o continente. |
Gadolínio | em honra de Johan Gadolin (1760-1852), um dos primeiros investigadores das terras raras. |
Térbio | de Ytterby, uma localidade da Suécia onde se localiza a pedreira a partir de cujos minerais foi isolado. |
Disprósio | do grego "dysprositos", difícil de obter. |
Hólmio | de Holmia, a designação latinizada da cidade de Estocolmo, cidade natal de um dos seus descobridores. |
Érbio | de Ytterby, uma localidade da Suécia. |
Escândio | de Escandinávia, em homenagem à Escandinávia. |
Túlio | a cidade mítica de Thule. |
Itérbio | de Ytterby, uma localidade da Suécia onde se localiza a pedreira partir de cujos minerais foi isolado. |
Lutécio | de Lutécia, o nome latino da cidade de Paris. |
História |
A partir de amostras do mineral ytterbite (gadolinite) enviadas por Carl Axel Arrhenius, o químico e mineralogista finlandês Johan Gadolin, professor na Universidade de Turku, isolou um óxido desconhecido (uma terra na linguagem química da época), a que deu o nome de ytteria, uma referência a Ytterby, a localidade onde se situa a pedreira onde o mineral fora recolhido. A partir de 1800 a ytterbite passou a ser conhecida por gadolinite, em honra de Johan Gadolin.
A partir da gadolinite, o químico Anders Gustav Ekeberg isolou o elemento químico berílio, mas não conseguiu reconhecer a presença das terras raras, os outros elementos em que aquele minério é rico. Mais tarde, em 1803, um mineral recolhido em Bastnäs, uma localidade próxima de Riddarhyttan, na Suécia, que se acreditava ser um mineral de ferro-tungsténio, foi reanalisado por Jöns Jacob Berzelius e Wilhelm Hisinger, que obtiveram um óxido branco a que deram o nome de ceria, depois identificado como um óxido de cério. Martin Heinrich Klaproth descobriu independentemente aquele óxido, dando-lhe o nome de ochroia.
Assim, em 1803 eram conhecidos os óxidos de dois elementos pertencentes às terras raras: o ítrio e o cério. A partir deste ponto, a semelhança nas propriedade químicas dos elementos que hoje integram o grupo fez com que demorasse cerca de 30 anos até que os investigadores pudessem determinar a presença de outros elementos naqueles óxidos, tal é a dificuldade de separação.
Em 1839 Carl Gustav Mosander, um assistente de Berzelius, conseguiu separar o óxido então designado por ceria em dois componentes, aquecendo-o um seu nitrato e dissolvendo o produto em ácido nítrico. Deu a designação de lanthana ao óxido do sal solúvel que obteve, demorando três anos até conseguir separar o lanthana no seu didymia (gémeo) e em lantânio puro. O didymia, não separável pelas técnicas usadas por Mosander, era ainda uma mistura de óxidos.
Em 1842 Mosander também separou o ytteria em três óxidos: ytteria pura, terbia e erbia (nomes derivados de Ytterby, a localidade de onde o mineral original proviera). Ao elemento que dava origem a sais rosados Mosander deu o nome de terbium; ao que produzia peróxidos amarelados erbium. Estavam assim isolados o térbio e o érbio, o que elevava o número de terras raras conhecidas a seis: yttrium (ítrio), cerium (cério), lanthanium (lantânio), erbium (érbio), terbium (térbio) e didymium (didímio), este último afinal uma mistura de dois elementos diferentes (praseodímio e neodímio).
Nils Johan Berlin e Marc Delafontaine conseguiram também separar o ytteria e encontraram as mesmas substâncias que Mosander obtiverad, mas Berlin denominou (em 1860) a substância que produzia sais rosados como erbium e Delafontaine designou a substância que produzia o peróxido amarelado como terbium. Esta confusão levou a várias identificações erradas, incluindo diversos casos de isolamento de novos elementos que depois se provou serem já conhecidos, tais como o mosandrium de John Lawrence Smith, ou o philippium e decipium de Delafontaine.
As dificuldades impostas pelas semelhanças físico-químicas levaram a que durante mais três décadas não surgissem novos isolamentos de elementos, sendo o didymium listado nas tabelas periódicas como um elemento químico com massa molecular de 138. Em 1879 Delafontaine usou a então recém inventada técnica de espectroscopia de chama e descreveu um espectro óptico complexo, com linhas de absorção que indicavam a presença de mais do que um elemento. Também em 1879, o químico francês Paul Émile Lecoq de Boisbaudran isolou um novo elemento pertencente ao grupo das terras raras, o samarium (samário) a partir do mineral samarskite.
A partir de samaria, os óxidos de samarium, Paul Émile Lecoq de Boisbaudran isolou em 1886, resultado que foi confirmando por Jean-Charles Galissard de Marignac, que obteve o mesmo elemento directamente da samarskite. A este elemento deram o nome de gadolinium (gadolínio), em honra de Johan Gadolin, designando os seus óxidos como gadolinia.
Análises espectroscópicas de amostras da samaria, ytteria e samarskite, realizadas por William Crookes, Lecoq de Boisbaudran e Eugène-Anatole Demarçay entre 1886 e 1901, revelaram linhas espectrais que indicavam a presença de um elemento desconhecido, que quando em 1901 foi isolado por cristalização fraccionada foi designado por europium (európio).
A partir de 1839 surgiu uma terceira fonte de terras raras, um mineral similar à gadolinite, o uranotantalum, hoje designado por samarskite. Este mineral foi inicialmente encontrado em Miass, no sul dos Montes Urais, sendo descrito pela primeira vez por Gustave Rose. O químico russo R. Harmann postulou então que um novo elemento, o ilmenium (de ilmenite, um mineral da região de Ilmen, nos Urais), deveria estar presente no mineral, mas Christian Wilhelm Blomstrand (1826-1897), Jean-Charles Galissard de Marignac e Heinrich Rose apenas nele encontraram tântalo e nióbio.
Nos princípios do século XX, o exacto número de terras raras era pouco claro, estimando-se que pudesse atingir os 25 elementos. Apenas quando a utilização de raios x, aplicada ao estudo da difracção em cristais por Henry Moseley, permitiu a determinação dos números atómicos se concluiu que o número de elementos químicos pertencentes aos lantanídios teria de ser 15, estando ainda em falta o elemento com número atómico 61. Por outro lado, a utilização da difracção de raios x permitiu provar que o hafnium (háfnio) não era uma terra rara e que o anúncio feito por Georges Urbain da descoberta do elemento de número atómico 71 era incorrecto.
Características e usos |
As formas elementares das terras raras são metais tipicamente macios, maleáveis e dúcteis, geralmente reactivos, especialmente a temperaturas elevadas ou quando finamente divididos, com cores que variam de cinza escuro a prateado.
As principais fontes económicas de terras raras são os minerais bastnasite, monazite e loparite e as argilas lateríticas. Apesar da sua abundância relativa elevada, os minerais de terras raras são mais difíceis de minerar e de extrair do que fontes equivalentes de metais de transição, devido em parte às suas semelhanças químicas. Esta dificuldade torna os metais de terras raras relativamente caros, pelo que o seu uso industrial foi limitado até serem desenvolvidas técnicas de separação de alto rendimento, tais como a troca iónica, cristalização fraccional e extracção líquido-líquido nas décadas de 1950 e de 1960.[3]
As propriedades químicas e físicas das terras raras são utilizadas numa grande variedade de aplicações tecnológicas, que vão desde a constituição de catalisadores à produção de materiais luminescentes e de magnetos. Os metais de terras raras estão incorporados em aplicações como os supercondutores, magnetos miniaturizados, catalisadores utilizados em refinação de produtos diversos e componentes para carros híbridos.[4] Iões de terras raras são utilizados como os átomos activos em materiais luminescentes usados em aplicações de optoelectrónica, com destaque para o laser Nd:YAG. Foram também extensivamente utilizados como dopantes em tubos de raios catódicos para televisores e computadores.
A determinação da concentração relativa de terras raras é usada em Geologia para a determinação da fonte dos magmas que constituem as rochas ígneas e para a datação de alguns minerais, entre os quais as granadas, através da abundância relativas do par neodímio/samário.
Localização geográfica e comercialização |
É estimado que cerca de 97% das terras-raras estejam localizadas na Ásia, especialmente na China, que detém 2/3 das reservas globais e 87% do total comercializado no mundo.[5] Com praticamente o monopólio chinês das terras-raras, o preço desses commodities se valorizou muito no mercado mundial.[5]
Grupo das terras raras |
As terras raras ocupam a seguinte posição na tabela periódica dos elementos:
1 H | 2 He | ||||||||||||||||||||||||||||||
3 Li | 4 Be | 5 B | 6 C | 7 N | 8 O | 9 F | 10 Ne | ||||||||||||||||||||||||
11 Na | 12 Mg | 13 Al | 14 Si | 15 P | 16 S | 17 Cl | 18 Ar | ||||||||||||||||||||||||
19 K | 20 Ca | 21 Sc | 22 Ti | 23 V | 24 Cr | 25 Mn | 26 Fe | 27 Co | 28 Ni | 29 Cu | 30 Zn | 31 Ga | 32 Ge | 33 As | 34 Se | 35 Br | 36 Kr | ||||||||||||||
37 Rb | 38 Sr | 39 Y | 40 Zr | 41 Nb | 42 Mo | 43 Tc | 44 Ru | 45 Rh | 46 Pd | 47 Ag | 48 Cd | 49 In | 50 Sn | 51 Sb | 52 Te | 53 I | 54 Xe | ||||||||||||||
55 Cs | 56 Ba | 57 La | 58 Ce | 59 Pr | 60 Nd | 61 Pm | 62 Sm | 63 Eu | 64 Gd | 65 Tb | 66 Dy | 67 Ho | 68 Er | 69 Tm | 70 Yb | 71 Lu | 72 Hf | 73 Ta | 74 W | 75 Re | 76 Os | 77 Ir | 78 Pt | 79 Au | 80 Hg | 81 Tl | 82 Pb | 83 Bi | 84 Po | 85 At | 86 Rn |
87 Fr | 88 Ra | 89 Ac | 90 Th | 91 Pa | 92 U | 93 Np | 94 Pu | 95 Am | 96 Cm | 97 Bk | 98 Cf | 99 Es | 100 Fm | 101 Md | 102 No | 103 Lr | 104 Rf | 105 Db | 106 Sg | 107 Bh | 108 Hs | 109 Mt | 110 Ds | 111 Rg | 112 Uub | 113 Uut | 114 Uuq | 115 Uup | 116 Uuh | 117 Uus | 118 Uuo |
O grupo das terras raras inclui os seguintes elementos químicos:
- Lantânio
- Cério
- Praseodímio
- Neodímio
- Promécio
- Samário
- Európio
- Gadolínio
- Térbio
- Disprósio
- Hólmio
- Érbio
- Túlio
- Itérbio
- Lutécio
- Escândio
- Ítrio
Notas
↑ Edited by N G Connelly and T Damhus (with R M Hartshorn and A T Hutton), ed. (2005). Nomenclature of Inorganic Chemistry: IUPAC Recommendations 2005 (PDF). Cambridge: RSC Publ. ISBN 0-85404-438-8. Consultado em 17 de dezembro de 2007
↑ Gschneidner KA, Cappellen, ed. (1987). «1787-1987 Two hundred Years of Rare Earths». Rare Earth Information Center, IPRT, North-Holland. IS-RIC 10
↑ Spedding F, Daane AH: "The Rare Earths", John Wiley & Sons, Inc., 1961
↑ «Haxel G, Hedrick J, Orris J. 2006. Rare earth elements critical resources for high technology. Reston (VA): United States Geological Survey. USGS Fact Sheet: 087‐02.» (PDF). Consultado em 19 de abril de 2008
↑ ab Sílvia Salek (16 de maio de 2011). «Megainvestimento da Foxconn pode aumentar dependência brasileira da China». BBC Brasil. Consultado em 16 de abril de 2011